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TEATRO

o endi­reita

28.08 a 25.10.09

O Endireita – Do Livro para o Palco

Lançado somente em suporte virtual (o leitor só tem acesso pela internet), o livro O Endireita, do luso-brasileiro Edson Athayde, é adaptado para os palcos em projeto do ator Davi Amarante. Convidado para dirigir, Zé Henrique de Paula (de As Troianas – Vozes da Guerra e Cândida, entre outros) diz que as histórias são instigantes e a montagem usa elementos circenses. O elenco conta, ainda, com Nábia Villela, Cadu de Souza e João Buono

Uma galeria de personagens improváveis e complexos – como um homem que queria endireitar o mundo e acabou endireitando colunas – compõe o núcleo narrativo do espetáculo O Endireita. O projeto, adaptação do livro homônimo do escritor luso-brasileiro Edson Athayde, foi idealizado pelo ator Davi Amarante. A direção é assinada por Zé Henrique de Paula (de Senhora dos Afogados, Cândida e As Troianas – Vozes da Guerra.

A visão peculiar que o autor tem da alma humana – e de suas virtudes, vícios e aspirações – foi transferida para o palco em forma de sarau lítero-musical, cujo mote principal é a possibilidade de existência do fracasso, bem como as formas de encará-lo. Por meio do uso de música e interação com o público, os espectadores vão vivenciar uma realidade paralela que retoma velhas emoções esquecidas. O público irá transitar entre as mais variadas histórias, como a do homem que pensa 20 vezes antes de entrar em um bonde e, por isso, pode perder a possibilidade de encontrar seu grande amor, ou a do rapaz sem braços e sem pernas que quer atravessar o Canal da Mancha.

“Apesar de às vezes beirarem o absurdo, o surreal, os personagens do livro têm características realistas bastante intensas. Algumas delas tão tristes, mas tão presentes em todos, são apresentadas de maneira poética, que bate com luva de pelica no rosto de quem se acha muito justo e moralista, mas vive num círculo ganancioso e egoísta sem se aperceber de tal realidade”, afirma Davi Amarante. Tratando tais assuntos de maneira suave, o espetáculo questiona, de maneira quase jocosa e com referências circenses, o comportamento humano, seus vícios e virtudes.

Adaptação

O livro O Endireita, composto por histórias curtas, contadas em prosa poética, só foi lançado virtualmente (e pode ser lido no site www.oendireita.com, onde também está disponível o download da versão em pdf). Em entrevista ao jornal português Público, Athayde justifica a escolha: “Qualquer autor mesmo que venda bem ganha pouco. E os livros nunca estão disponíveis para os próprios autores. Os livros saem logo dos catálogos. Temos de pedir, encomendar, podem esgotar, são coisas que não controlamos. Mas se a tecnologia permite ultrapassar estes problemas, porque é que eu tenho de viver isso?” A obra também foi uma das primeiras a ser publicadas de acordo com o novo acordo ortográfico.

A modernidade de suporte, unicamente virtual, também pode ser encontrada na linguagem dinâmica e na brevidade dos contos. Já os temas são clássicos e universais, como amor, frustração, superação. Para o diretor, Zé Henrique de Paula, essa união também transparece cenicamente: “A estrutura da peça, depois de adaptada, utiliza-se de recursos muito caros ao teatro contemporâneo, como a fragmentação, a simultaneidade, a mescla entre épico, lírico e dramático. Sendo assim, acabamos tendo uma união e, por vezes, uma contraposição entre o clássico (nos temas) e o moderno (na estrutura)”.

Para a transformação de literatura em dramaturgia, diretor e elenco optaram pela manutenção da estrutura do livro, ou seja, ausência de diálogos, presença de um narrador e do texto em prosa poética. “O que fizemos foi relacionar as diferentes situações e, utilizando como fio condutor o conto que dá titulo à peça e ao livro, chegamos aos quatro personagens: o Endireita, o Presidente do Planeta, o Mordomo Quase Anão e a Mulher”, explica Amarante. Dessa forma, os quatro atores estão sempre em cena, assumindo um dos três papéis (personagem, narrador-personagem ou narrador), agindo, falando ou cantando.

A direção

Para o diretor, a peça foi adaptada e construída na sala de ensaios. Em improvisações com os atores, foi-se descobrindo o que poderia ou deveria ser encenado, o que deveria ser narrado e o que deveria ser cantado. “Experimentamos as possibilidades e fomos selecionando e sintetizando as opções mais apropriadas”, afirma Zé Henrique. “Fui convidado pelo Davi (Amarante). Achei que trabalhar com adaptação de textos não-teatrais seria uma experiência interessante, com a qual tinha trabalhado poucas vezes. As histórias são instigantes e o material me pareceu cheio de possibilidades cênicas”, afirma o diretor, reconhecido por seu trabalho no Núcleo Experimental.

O texto, que inicialmente seria adaptado como um monólogo, possui certas características muito marcantes, como um apelo circense, um universo onírico que lembra o de Fellini e ainda certa desesperança machadiana. Tais aspectos orientaram a montagem em seus mais diversos níveis, desde direção e trabalho de ator até cenografia e figurino. “Ficamos meses trabalhando o gestual, o repertório do universo circense, sempre trazendo uma certa mágoa, uma desesperança com a humanidade que percebemos serem comuns a todos os textos”, comenta Amarante. “E na esfera da atuação, os próprios artistas circenses, o estilo clownesco, o melodrama e a Commedia dell’Arte foram influências que ajudaram a montar os diferentes momentos dos personagens.”

A preparação dos atores, de Inês Aranha, trabalhou técnicas corporais com o objetivo de despertar a expressividade e a criatividade do elenco, além de afinar a simbiose entre os quatro atores. Pouco a pouco, o grupo chegou a um conceito que mistura clown, bufão e outras técnicas tradicionais de farsa.

Cenografia, música e figurino

A ambientação corrobora para a criação de um ambiente mambembe, apostando em uma pobreza proposital que, como efeito estilístico, enriquece o conjunto. O cenário, inspirado em elementos circenses, tem forte influência de cartazes antigos de circo e vaudeville, principalmente de Toulouse-Lautrec, bem como outros impressionistas e artistas menos conhecidos dos cabarés de Montmartre na Belle Époque. Assim, cria-se um ambiente de circo decadente, de camarim de palhaço, de cores apagadas e tons esmaecidos.

A música, elemento sempre marcante nos espetáculos do Núcleo Experimental (dirigido por Zé Henrique), é também muito presente na peça, mesmo não se tratando de uma montagem do Núcleo. Vários trechos do livro foram transformados em letra de música, sem necessidade de grandes alterações, além da criação de muita trilha incidental pela diretora musical e preparadora vocal Fernanda Maia. “Paralelamente, devorávamos filmes de Fellini, Chaplin, ouvíamos musicas que iam do tradicional cabaré à Ópera do Malandro e nos imergíamos em imagens de pintores expressionistas e impressionistas, de Van Gogh a Toulouse-Lautrec, bem como outros artistas de Montmartre do fim do século XIX”, conta Amarante.

Sobre a equipe.

Zé Henrique de Paula – diretor

Pós-graduado em Artes Cênicas pela Escola de Comunicação e Artes da USP. Foi assistente do cenógrafo J.C.Serroni nas montagens de Nova Velha Estória e Trono de Sangue, ambas dirigidas por Antunes Filho.

Atualmente, é docente do Teatro Escola Macunaíma, lecionando Interpretação, Caracterização Cênica e História do Teatro, além de professor convidado na Unicamp. Seus mais recentes trabalhos como diretor: R&J de Joe Calarco; Mojo de Jez Butterworth, Senhora dos Afogados de Nelson Rodrigues, Cândida de Bernard Shaw, A Comédia dos Erros, de Shakespeare, e Judas em Sábado de Aleluia, de Martins Pena, ambas montadas numa carroça-palco que rodou diversos estados. Outros trabalhos seus são: É 20! As Folias do Século, com roteiro de Jamil Dias, comédia musical que resgata o trabalho do diretor Luiz Antonio Martinez Corrêa, pesquisando o repertório do teatro musical brasileiro; Revelação, de Rafael Primo; Naked Boys Singing!, de Bob Schrock, polêmico musical off-Broadway sobre a nudez masculina; O Despertar da Primavera, de Frank Wedekind, releitura do clássico alemão.

Edson Athayde

Edson Athayde nasceu no Rio de Janeiro, no final da década de 1960, mas vive e trabalha na Europa, nomeadamente em Portugal, há 17 anos. Redator publicitário há quase 25 anos, sendo o mais premiado da história da publicidade portuguesa, sempre desenvolveu atividades paralelas nas várias áreas da comunicação. Já apresentou programas de televisão, dirigiu jornais, é cronista regular de algumas das principais publicações portuguesas, produz música e foi o coordenador da campanha que elegeu por duas vezes o primeiro-ministro de Portugal. Nos últimos 10 anos, publicou sete livros em Portugal. Alguns entraram direto para as listas dos mais vendidos, todos foram motivo de várias reedições. É considerado, por importantes cronistas portugueses, como parte integrante do que melhor se publica naquele país. Como publicitário já recebeu centenas de prêmios internacionais, onde destacam-se seis Leões no Festival de Cannes.

Davi Amarante

Ator e cantor, natural de São Paulo, é formado pela Oficina de Atores Nilton Travesso e pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo – ECA-USP. Já participou de mais de uma dezena de espetáculos teatrais, destacando-se sua participação como um dos protagonistas da Rapsódia dos Divinos, espetáculo produzido por Cintia Abravanel em cartaz durante todo o ano de 2007 no Teatro Imprensa em São Paulo. Este ano protagonizou o monólogo Sufoco, de Cristiano Ricardo, no Espaço dos Satyros II. Também recentemente, foi o protagonista da webnovela Alô Alô Mulheres, do canal de TV pela Internet AllTV, interpretando Heitor Damasco. Participou das novelas Amigas e Rivais do SBT e Água na Boca da Bandeirantes. Paralelamente à carreira de ator, Davi ainda segue divulgando seu projeto musical intitulado Davi Não Vê Estrelas, iniciado em Portugal (onde o CD foi Disco de Ouro) ao lado do amigo e ex-chefe Edson Athayde e recém-lançado no Brasil.

Nábia Villela

Nábia tem uma trajetória interessante e privilegiada. Sua voz ímpar – que vai do popular à ópera – foi descoberta pelo primo, o diretor teatral Gabriel Villela, em uma festa em Carmo do Rio Claro. No começo dos ensaios de Morte e Vida Severina (1997), Gabriel a convidou para integrar o elenco do espetáculo. Nábia, sem ter pisado em um palco antes, aceitou o convite. Depois vieram A Vida é Sonho (1998), Alma de Todos os Tempos (1999), Os Saltimbancos (2001) e Gota D’água (2001), todos dirigidos por Gabriel. Em 2002, atuou em A Borboleta sem Asas no TBC. Voltou a ser dirigida pelo Gabriel no espetáculo A Ponte e a Água de Piscina onde interpretava belas canções, como um trecho de Hino ao Amor (que já foi gravada por Edith Piaf e Dalva de Oliveira. Todas à capela. Em 2004 fez o espetáculo Marias do Brasil e, em 2005, vários trabalhos com o grupo S/Arautos (destaque para o espetáculo Amor). Leonce e Lena, Rapsódia dos Divinos, Era Uma Vez um Rio, Tieta do Agreste – o Musical e o show Retrato da Vida são trabalhos recentes. Atualmente está no ar na novela do SBT Revelações, em que interpreta uma das protagonistas e grava a próxima produção da emissora, baseada na obra de Janete Clair.

Ficha técnica

Texto: Edson Athayde.

Direção: Zé Henrique de Paula.

Elenco: Davi Amarante, Nábia Villela, Cadu de Souza, João Buono, Bárbara Bonnie (stand-in).

Assistente de Direção: Thiago Ledier.

Direção Musical: Fernanda Maia.

Preparação de Atores: Inês Aranha.

Cenografia e figurinos: Zé Henrique de Paula.

Iluminação: Fran Barros.

Trilha Composta: Fernanda Maia.

Coordenador de Produção: Sergio Mastropasqua.

Produção Executiva: Claudia Miranda.

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